quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Oferta de emprego: «Animador SocioCultural com experiência»

Há uma linha muito ténue que separa a leviandade da escrita da realidade factual. Isto a propósito de um anúncio on-line de oferta de emprego para «Animador SocioCultural com experiência», referência # 1934568, divulgado no portal net-emprego, no dia 26 de fevereiro de 2014.

Uma instituição social pretende contratar uma animadora sociocultural com experiência para exercer funções na valência de centro de dia com idosos. O insólito desta oferta de emprego, e sublinho insólito, entre os vários requisitos é a exigência a que a(s) candidata(s) ao posto de trabalho tenha(m) «conhecimentos em cozinha».

É de capital importância para a salvaguarda do bom nome da instituição e da sua direção técnica, que haja o bom senso nesta matéria, no sentido, de esclarecer cabalmente, sobre a oferta de emprego. É pretendido recrutar um ajudante de cozinha ou um animador sociocultural? Estamos a falar de duas profissões muito distintas: o ajudante de cozinha trabalha numa cozinha em redor de tachos; e o animador sociocultural trabalha numa relação social e educativa com pessoas.

Repudio a forma grosseira com que os agentes sociais, em concreto, os animadores socioculturais são considerados por algumas instituições, quando a legislação em vigor define os parâmetros técnicos e os recursos humanos necessários ao bom funcionamento das instituições sociais, nomeadamente, os centros de dia.

É lamentável que a direção técnica da instituição tenha cometido um erro grosseiro e de uma atrocidade social e de classe para com os agentes sociais, digna de um atestado de incompetência. É lamentável que a direção do centro social desconheça o trabalho que o animador sociocultural desenvolve com a população sénior.

Assumo a minha ignorância sobre um dos requisitos para exercer funções de animador sociocultural numa instituição de acolhimento de seniores: o domínio da arte da culinária. Talvez seja exigível, apenas em alguns cérebros mais acutilantes.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

O turismo das culturas

O potencial turístico associado à cultura é a força motriz na dinamização económica de uma comunidade e de atrativo para um território. É fundamental pensar um plano de promoção turística com respeito pelos ativos culturais locais e regionais, no sentido de esses ativos serem a alavanca para o desenvolvimento integrado do território, das suas gentes e do turismo cultural como aposta política racional. Podemos considerar como um dos ativos culturais o património cultural material e imaterial. 

Pensar o turismo no território cultural municipal exige uma reflexão aturada e uma partilha comum de objetivos para que, o plano de desenvolvimento turístico, não seja um documento de intenções políticas, mas um referente estratégico de envolvimento e participação da sociedade civil.  Pensar o turismo implica diálogo com os atores locais, exige envolvimento e ações qualificantes dos ativos culturais. 

O binómio cultura e turismo remete o processo para um campo de ação que será mais profícuo do ponto de vista do envolvimento da comunidade, da ideia de participação ativa dos turistas e visitantes, se estiver alicerçado num processo comunicativo que envolva e qualifique o tecido sociocultural. 

 Há que projetar a cultura no turismo. Esta divisa é política, social, económica e cultural, mas mais importante, é a perceção real e efetiva que a cultura desempenha na alavancagem da economia local, na participação da comunidade no seu próprio processo de desenvolvimento económico, na afirmação das identidades e na promoção da cultura local. 

 É de fulcral importância desenvolver as potencialidades turísticas virgens dos pequenos municípios, que por razões geográficas, económicas e de estratégia política menos acertada, remeteram os territórios para uma segunda linha de desenvolvimento endógeno. Hoje há que potencializar outros modelos de desenvolvimento comunitário. 

 A promoção cultural e turística através de eventos socioculturais qualificantes, genuínos na participação comunitária, projetores da história e da cultura locais são um veículo de desenvolvimento do território, de fixação da população, de gerenciamento de riqueza e de valorização da identidade do lugar e das suas gentes, e dos ativos culturais.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

A desgovernação na cultura

A ação cultural municipal não pode estar sujeita a um calendário de vontades político-partidárias. Esta é uma preocupação que tenho manifestado há muito, em vários fóruns de discussão e em encontros de trabalho. É urgente que os agentes culturais tenham a coragem de reivindicar uma política cultural municipal estruturada e musculada nos recursos e nos ativos culturais do município, que projete a cultura como pólo dinamizador e de desenvolvimento comunitário local.

É fundamental dinamizar a cultura, mas antes, compreender a função dos equipamentos culturais municipais (centros cívicos, biblioteca municipal, espaços museológicos), para então, desenhar um projeto dinamizador das culturas. Há que potenciar os espaços socioculturais, imprimindo-lhes identidade comunitária, envolvendo na sua dinamização os agentes culturais e educativos.

A escola não pode estar divorciada da comunidade cultural, a reciprocidade entre ambas é fundamental para um projeto pedagógico contínuo no tempo, capaz de proporcionar aprendizagens não formais. A escola é um elemento nuclear no trabalho cultural. É fulcral construir pontes entre a comunidade e a escola, entre agentes educativos e socioculturais, enfim, aproximar a escola do território cultural. Não concebo, ideologicamente, uma política cultural municipal que não esteja alicerçada na pedagogia cultural.

Não é legítimo falarmos na concretização de política cultural, se não houver, um plano pensado e cuja execução seja viável a médio e longo prazo, isento de clientelismos e desenhado em função do calendário político-partidário. Falemos antes, num calendário de atividades culturais. Este não é despropositado, se estiver fundamentado num projeto de desenvolvimento comunitário cultural.

As agremiações culturais e artísticas, os artistas que singram no mundo das artes, por conta e risco, os agentes educativos e turísticos têm uma palavra importante a acrescentar ao debate. Eles devem ser convocados a participar no projeto de governação da cultura. É importante que os executivos municipais compreendam o alcance que a cultura tem no desenvolvimento local e dêem passos firmes na consolidação de uma verdadeira e integradora política cultural.